quinta-feira, 3 de setembro de 2009

O Instituto Ethos - II

A breve descrição dos indicadores está acompanhada com algumas questões fulcrais, para o desenvolvimento e conclusões da própria Tese:

1 - Valor, transparência e “governance”

Os valores e princípios éticos são a base da cultura de uma empresa. A acção das empresas deve trazer benefícios para a sociedade, proporcionar a realização profissional dos seus funcionários, promover benefícios para os seus parceiros e meio ambiente e trazer retorno financeiro para os seus investidores. Deve uma empresa adoptar uma postura clara e transparente no que diz respeito aos objectivos e compromissos éticos, fortalecendo assim a legitimidade social.
O código de ética orienta a postura social de uma organização para os seus parceiros. È a base de sustentação de uma empresa socialmente responsável e requer a participação dos “stakeholders” no seu desenvolvimento, para que exista uma comunicação consistente entre todos.
Os conceitos relacionados com os valores empresariais estão associados à cultura da empresa e por isso devem ser todos envolvidos nos processos, na forma de monitorizar as suas acções para assim estabelecer uma base critica e de desenvolvimento do conceito de RS.
È também importante o aumento dos padrões de concorrência leal, bem como perceber como a acção de uma organização influencia a comunidade na qual está integrada e promovendo a interacção com os “stakeholders”

Questões que podem ser colocadas:
- Quais os grupos ou “stakeholders” que podem ser afectados pelos impactos sociais e ambientais da sua actividade?
- São consultados os representantes da comunidade visando conhecer as suas necessidades em relação ao meio ambiente e assim entender as suas prioridades?
- Existem mecanismos para discutir regularmente com a comunidade os resultados da monitorização ambiental e as suas implicações?
- Disponibiliza informações para a comunidade de fácil compreensão, sobre a actividade da organização?
- Envolve a comunidade no planeamento e desenvolvimento das actividades de lavra e esforços de recuperação da área de exploração?

2 - Público Interno

A responsabilidade social das empresas não se limita a respeitar os direitos dos seus trabalhadores, mas também deve investir no seu desenvolvimento pessoal e profissional. Deve também apostar na melhoria das condições de trabalho, tendo em atenção as culturas locais e as minorias inseridas na comunidade onde actua.
As organizações devem ter com os sindicatos um diálogo positivo, visando as suas discussões na melhoria das condições de trabalho dos seus funcionários. Considerar remunerações justas e atribuição de benefícios aos funcionários para também fomentar o desenvolvimento social. É também importante cuidado com a saúde e segurança no trabalho. Não utilizar as demissões como o primeiro recurso para a redução de custos e quando inevitáveis usar ferramentas que tenham em conta a empregabilidade, formação e idade do funcionário. Deve uma organização fornecer aos seus funcionários condições dignas de aposentadoria que permitam condições de vida dignas.
Uma organização deve influenciar socialmente todos os que com ela colaboram, incentivando assim o aprofundamento do conceito de responsabilidade social a todas as organizações na sua esfera de influência.
Deve apostar no envolvimento dos seus funcionários na solução de problemas da organização, favorecendo também assim a valorização e desenvolvimento profissional e social.

Questões que podem ser colocadas:
- Aplica e cumpre as normas de exploração mineira quer a céu aberto quer subterrâneas?
- São realizadas campanhas de reforço de consciencialização relacionada com a saúde e a segurança?
- Oferece e mantém programas e benefícios de saúde para os seus colaboradores e respectivos familiares?
- Monitoriza com periodicidade o clima organizacional junto dos seus funcionários e subcontratados, guardando o sigilo e preocupa-se com a representatividade e aplicação técnica adequada a um resultado válido?
- Propõe e executa um plano de trabalho para reverter os itens considerados problemáticos identificados no clima organizacional?


3 - Meio ambiente

A política ambiental de uma organização devem ter em conta a gestão racional dos recursos naturais, e a utilização dos mesmos deve ser feita em acordo com as boas práticas ambientais de quem os produz. Deve tomar iniciativas que promovam o desenvolvimento de projectos e investimentos de compensação ambiental derivados da actividade de uma organização.
Deve apoiar e desenvolver campanhas, projectos e programas educativos para os seus funcionários e para a comunidade na promoção de comportamentos ambientais responsáveis.
As organizações além de politicas de controlo interno, devem colaborar com as entidades externas em questões de fiscalização. Os processos do sistema de produção, que eventualmente produzam materiais potencialmente noviços, devem criar mecanismos de minimização de impacto ambiental, recorrendo à utilização de produtos recicláveis e à própria reciclagem, no tratamento de resíduos sólidos e líquidos, limitando a emissão de produtos poluentes. Devem optar também pela redução no consumo de energia, água e consumíveis que consequentemente reduzirão quer a sua degradação a nível da sua utilização, como da forma e quantidade que são utilizados.

Questões que podem ser colocadas:
- São realizadas auditorias da estabilidade dos maciços em que opera?
- São realizadas auditorias de estabilidade de depósitos de inertes?
- Existe um plano de contingência para possíveis impactos das suas actividades, produtos ou serviços, nas suas áreas ou de terceiros, passíveis de gerar danos no meio ambiente, à saúde e à sua propriedade?
- Existe plano de fecho após o encerramento da actividade mineira?
- Possui a organização um plano de recuperação das áreas de acção mineira?
- Existem metas de consumo de energia?
- A empresa desenvolve acções e processos que assegurem a qualidade e quantidade de água utilizada e afectada pelas suas actividades?
- Possui sistema de monitorização da qualidade e quantidade da água do início ao fim das suas actividades?
- Nas suas actividades gera efluentes com qualidade de água igual ou melhor do que a água captada?
- Existem processos de reciclagem ou de reutilização da água na área de lavra?
- Possui parcerias com instituições de pesquisa para o desenvolvimento de alternativas a substâncias químicas potencialmente poluidoras ou que provoquem danos à saúde?
- Possui processos de gestão adequada dos resíduos gerados pelas suas operações?
- Tem a empresa metas para minimizar a quantidade de resíduos gerados pelas suas operações?
- Possui metas de redução de emissões?
- Exige aos seus contratados que a remoção, transporte, comercialização e a deposição de resíduos, somente sejam realizados devidamente autorizados por documentação apropriada?
- Monitoriza os resíduos depositados ou colocados e comercializados em áreas de terceiros?
- A empresa possui planos de emergência para lidar com eventuais fugas de substâncias perigosas e comunica as partes afectadas?
- Utiliza mecanismos de controlo da erosão?
- Possui sistema de monitorização para determinar a transformação das condições do solo desde o início das actividades?
- Existe plano de recuperação das áreas de exploração, provisões que assegurem as condições do solo após o processo de recuperação, estejam ecologicamente integrados à fauna e à flora locais e que não vão gerar novos impactos?
- A empresa conhece e monitoriza os impactos da sua actividade sobre a biodiversidade, tanto no solo como nos meios aquáticos?
- Possui estudos que confirmem que os seus produtos contêm níveis de radiação aceitáveis?

4 - Fornecedores

A acção das organizações junto dos fornecedores deve ser em transmitir os valores éticos de responsabilidade social e exigir que a forma como actuam seja coincidente com estes valores.
As questões relacionadas com o trabalho infantil devem ser uma das preocupações das organizações e também transmitir e monitorizar a forma como os seus fornecedores a aplicam.
O trabalho escravo não deve estar incluído no tecido produtivo de uma organização e deve a organização fiscalizar possíveis situações na sua cadeia de fornecedores e ter também uma acção fiscalizadora com as entidades governamentais.
Devem também as organizações promover junto dos seus fornecedores, a formação e especialização dos seus funcionários, tendo assim um papel fundamental do desenvolvimento económico e social.

Questões que podem ser colocadas:
- Possui a empresa meios que assegurem que os seus fornecedores e subcontratados adoptam padrões ambientais e de saúde e segurança que ela mesmo aplica?

5 - Consumidores e clientes

Os produtos comercializados pelas organizações devem ser fiáveis, devem transmitir aos consumidores segurança e evitar riscos de saúde. Publicitar os produtos de forma clara e credível para que seja entendível por todos, independentemente dos níveis culturais e sociais da comunidade e susceptíveis aos seus valores.
As organizações devem fornecer serviços de apoio aos seus clientes durante a longevidade e utilização dos seus produtos, para que estes sejam constantemente esclarecidos.
As organizações devem conhecer os danos potenciais que possam ser provocados pelas suas actividades e produtos e alertar os seus consumidores e casos de anomalias dos mesmos.

6 - Comunidade

Os funcionários e os parceiros são um dos activos mais importantes de uma organização. Por outro lado as organizações têm o dever de canalizar os investimentos que contribuíam para o bem-estar, investindo nas questões da educação e dos valores sociais, respeitando as questões sociais e culturais de cada comunidade.
Investir num relacionamento pró-activo com as organizações comunitárias e ONG´s, é importante na medida em que as várias sensibilidades são tidas em conta.
As acções sociais são outro dos aspectos a ter em conta. Devem ser adoptadas medidas de promoção de projectos sociais de qualidade, dirigidas pela organização para a comunidade.

Questões que podem ser colocadas:
- A empresa possui procedimentos formalizados e divulgados e treina os seus funcionários para a resolução de eventuais conflitos com a comunidade de forma ética e responsável?
- Possui mecanismos para assegurar que a comunidade local não está exposta a elementos potencialmente tóxicos oriundos das suas actividades?
- Realiza estudos que atestam que o estado de saúde da comunidade não é afectado pelas suas actividades?

7- Governo e sociedade

As organizações devem ser formadoras de cidadãos, promovendo a cidadania e a importância do voto, incentivando a discussão pública por parte da comunidade nos assuntos que mais os afectam, como por exemplo a participação popular e a corrupção.
A actuação nas acções partidárias por parte das organizações, a nível de doação de fundos e entidades partidárias dever ter um cariz fundamentalmente ético.
De forma alguma as organizações devem recorrer a formas de corrupção e pagamentos ilícitos, como forma de auto-promoção e de obtenção de benefícios que facilitem de alguma forma o desenvolvimento da sua actividade.
As organizações devem promover o diálogo socialmente responsável com associações, sindicatos e associações empresariais, de forma a elaborar propostas conjuntas de interesse público e de carácter social.
As organizações devem fomentar junto dos governos, o encaminhamento dos seus impostos para acções social e politicamente benéficas para a sociedade.

Questões que podem ser colocadas:
- A empresa e os seus subcontratados, contratam pessoas qualificadas e não qualificadas da comunidade da região onde actua?
- Desenvolve programas que contribuem para a qualificação das pessoas da região?
- Consume produtos ou serviços da região?
- Considera no plano de encerramento da mina, os impactos socioeconómicos e a sustentabilidade da economia local?

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O Instituto Ethos - I

O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social é uma organização sem fins lucrativos, e a sua missão é mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negócios de forma socialmente responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade justa e sustentável.
Criado em 1998 por um grupo de empresários e executivos oriundos da iniciativa privada, o Instituto Ethos é um pólo de organização de conhecimento, troca de experiências e desenvolvimento de ferramentas para auxiliar as empresas a analisar as suas práticas de gestão e aprofundar seu compromisso com a responsabilidade social e o desenvolvimento sustentável. É também uma referência internacional nesses assuntos, desenvolvendo projectos em parceria com diversas entidades em todo o mundo.
O Indicadores Ethos de RSE, têm auxiliado as empresas a incorporar na sua gestão conceitos e compromissos em prol do desenvolvimento sustentado. É uma ferramenta que tem o intuito de auxiliar e aprofundar o compromisso das organizações no tema da RS. Os Indicadores são um instrumento de consciencialização, aprendizagem e monitorização da RSE.
O questionário dos Indicadores Ethos está organizado em sete temas:
- Valor, transparência e “governance”
- Público interno
- Meio ambiente
- Fornecedores
- Consumidores e clientes
- Comunidade
- Governo e Sociedade

Notas sobre a revista Ingenium onde o tema principal é a Responsabilidade Social das Empresas

A economia global está a atravessar um enorme desafio, provocado pela crise que percorre sem excepção as economias mundiais. Neste conceito de incerteza global exige-se maior responsabilidade social às organizações. A RS deve ser dirigida para as vertentes económica, social e ambiental.
Desde o virar deste século, as multinacionais, têm assumido uma maior responsabilidade pela utilização mais equilibrada dos recursos naturais e o desenvolvimento de conceitos sociais mais positivos. Uma politica da responsabilidade social das empresas, não é verificar se uma causa tem valia, mas sim se essa causa representa uma oportunidade para criar valor.
Na nova visão sobre a RSE, tem aparecido o conceito de “stakeholder”. Os “stakeholders” são afectados pela actividade de uma organização e por isso deve haver uma relação político-instituicional em prol do aproveitamento dos recursos disponíveis. A envolvência dos “stakeholders” na actividade das organizações também implica que as suas actividades de risco estejam mais vulneráveis à supervisão e à crítica.
A RSE além de ser um suporte técnico de marketing, é um suporte das iniciativas sociais, por isso devem as organizações também optar por politicas de certificação ambiental, segurança e saúde no trabalho, dialogo com os “stakeholders”e auditorias sociais.
Em conjunto, as preocupações das organizações devem ser financeiras, sociais e ambientais. A RSE deve ter em conta que os benefícios financeiros não estão contra os benefícios sociais.
No contexto europeu, a União Europeia, lançou em 2001 o Livro Verde para a promoção no quadro europeu do tema da responsabilidade social das empresas. Vários intervenientes no processo de impor a responsabilidade social das empresas mostraram o seu entendimento na forma da valorização do conceito. As organizações, os sindicatos, investidores e organizações de consumidores, invocam acções de regulamentação, o aumento da envolvência dos “stakeholders” na tomada de decisões, transparência e condições éticas, como alguns dos pontos a serem salvaguardados. A RSE deve ser uma política de gestão e não apenas um complemento à actividade das organizações. É do entendimento da União Europeia que a RSE pode desempenhar um papel importante, contribuindo para um desenvolvimento sustentado, que fomente a competitividade e a inovação.
Em Portugal as politicas de RSE ainda estão limitadas, em particular a organizações de grande dimensão. As PME pela sua ligação às grandes organizações no fornecimento de serviços vêm as suas acções de RSE condicionadas por exigências externas, Verifica-se também que através de programas de desenvolvimento têm sido incentivadas parcerias entre organizações, IPSS e ONG’s. As parcerias com objectivos claros, apoiados pelo Estado, estão também sujeitas ao escrutínio técnico e financeiro.
A RES deve constituir um valioso contributo para alicerçar vantagens competitivas, que estimulem a produtividade e aumentem a eficácia de gestão.
O fenómeno de globalização da economia, está a provocar mudanças profundas na forma como as organizações actuam no mercado. Está mudança impõe alterações na estratégia e na forma como se aborda o mercado. A competitividade e introdução de novas tecnologias cria enormes desafios de adopção a uma nova realidade de mercado. Assim exige-se às organizações maior competitividade, produtividade e maior preocupação com a sua legitimidade social de actuação. Esta preocupação passa a não ser apenas dirigida, por parte dos seus accionistas para os lucros das organizações, mas também para aqueles que são influenciados pelas suas actividades (“stakeholders”).
A actuação baseada em princípios éticos e a melhoria na qualidade das relações são manifestações de responsabilidade social empresarial. Esta orientação na actividade da organização legitima socialmente uma organização, aumenta a sua reputação e melhora a sua imagem pública.
Organizações socialmente responsáveis estão melhor preparadas em assegurar a sustentabilidade do seu negócio a longo prazo. A dinamização do negócio assim o exige. É importante que uma organização se comprometa socialmente com a comunidade, aumente os seus níveis de protecção ambiental e uso racional dos recursos naturais.
Uma organização melhorará a sua performance quanto à RS, se estabelecer regras de comunicação claras, onde a informação é transmitida de forma correcta para os seus “stakeholders”.
Em Portugal as principais referências para estabelecer RS nas organizações são ISO 14001, a SA 8000 ou a NP4469-1. Como referido nas publicações anteriores a ISO 26000 apesar de não ter efeitos de certificação, é um importante guia na harmonização do conceito internacional de RS. O elemento comum a todos estes padrões é o de integrar princípios e práticas de RS nas actividades empresariais, tornando-se uma orientação para um melhor desempenho socialmente responsável.
Um dos aspectos importantes na RS é o impacto que a actividade das organizações tem no ambiente. Deve uma empresa garantir que as suas operações, produtos e instalações não causam impacto negativo no ambiente, no controlo e minimização da produção de resíduos e emissões, e redução de todas as práticas que possam comprometer a qualidade de vidas das gerações futuras. A compatibilidade entre a gestão financeira e ambiental é controversa e não chega a ser claro para muitos autores que seja facilmente possível. Um dos passos a ser dados é a inovação e implementação dentro das organizações, para que estejam melhor preparadas para avançar com estratégias eficazes de qualidade ambiental. Em termos legais a responsabilidade ambiental (RA) está associada ao Decreto-Lei nº 147/2008 de 29 de Junho e que deriva da Directiva Europeia 2004/35/CE. Este diploma estabelece o princípio de Poluidor-Pagador, que indica que civilmente cabe a cada um de nós zelar pelo meio ambiente.
Existem dois tipos de Responsabilidade Ambiental; a responsabilidade com base na falta incorrida por qualquer actividade económica, pública ou privada, e que possa ser danosa para o ambiente; e a responsabilidade estrita em termos de dano ambiental eminente ou efectivamente causado, as actividades de transporte de substâncias perigosas, a captação e rejeição de águas, entre outros.
As entidades responsáveis por estes danos são responsáveis pelas actividades de prevenção e reparação dos danos ambientais. Assim, devem as organizações identificar os potenciais riscos ambientais da sua actividade, para que exercem a sua actividade de forma a salvaguardar possíveis danos. Existem três tipos de reparação de danos ambientais: reparação primária, reparação complementar e reparação compensatória.
A Directiva da União Europeia anteriormente referida, prevê que os Estados-membros possam exigir uma garantia financeira sobre os danos ambientais causados. Esta Directiva, está dependente da legislação interna dos Estados-membros, o que dificulta a sua aplicabilidade. Apesar das dificuldades a nova Directoria é um passo em frente na protecção do ambiente associada a actividade económica.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Notas sobre a publicação do Banco Mundial "Grandes Minas Y La Comunidade" e "Rocks & Hard Places" de Roger Moody - IV

Os casos de Espanha e Canadá

A principal abordagem no estudo destes países, foi a ligação tripartida entre as comunidades, empresas e o governo central. A principal conclusão a que se chegou é que os três aprenderam com a experiência. Verificou-se que as comunidades, nos últimos anos, têm recebido cada vez maiores benefícios da actividade mineira.

Almadén, Espanha

A mina de Almaden laborou mais de 2.000 anos. Continha mais de 30% das reservas mundiais de mercúrio. Outras actividades desta comunidade, incluem a agricultura, criação de gado e o turismo.
A Mina de Almaden tem sido propriedade do Estado. A população da comunidade tem poucas alternativas e consideram que o Estado está abrigado a dar-lhes emprego. Os trabalhadores têm pouca produtividade e existe pouca inovação. Pelos benefícios económicos que trazia para o Estado, sempre foi preocupação da administração das minas foi o de incrementar a produção de minério.
Nos séculos XVI e XVIII, o governo começou fazer melhorias nas infra-estruturas e deu incentivos tributários para atrair trabalhadores para a mina, mas houve pouca evolução até 1975. Apenas em 1985 foi construída uma estrada em boas condições.
A nível ambiental a contaminação ambiental do mercúrio foi mínima, tendo sido o maior problema a desflorestação da zona, onde a madeira era usada para a construção de túneis e para a alimentação dos fornos para os processos metalúrgicos.
Com a diminuição da procura de mercúrio, grande parte devido aos seus custos ambientais, em 1978 o governo espanhol lançou o “Plan de Reconversion de la Comarca de Almadén” e que tinha como metas o desenvolvimento de outras minas de mercúrio, chumbo e zinco, desenvolvimento da área agrícola e reflorestação, aumento da produção e venda dos produtos agrícolas locais, promoção da produção e venda de produtos derivados do mercúrio, oferecer ao mercado técnicas de mineração de mercúrio e um matadouro.
Este projecto do governo não teve os resultados esperados, devido a um planeamento deficiente, falta de envolvimento da comunidade e falta de interesse do sector privado em utilizar aspectos financeiros nos aspectos técnicos alcançados. A queda da cotação do mercúrio e a pressão ambientalista também não ajudaram a que o projecto tivesse sucesso.
Entenderam o autores do estudo que o insucesso não de deveu as decisões tomadas mas sim pela deficiente metodologia. Um dos problemas foi a não intervenção do sector privado, devido à forte dependência financeira do Estado e o facto da prolongada historia de Almaden como propriedade do Estado. O projecto começou tardiamente e a sua condução foi alterando conforme os interesses políticos existentes.
Claramente Almaden é um exemplo de um desenvolvimento não sustentado. Durante a sua história a mina foi usada como arca do tesouro da Coroa espanhola. Os benefícios da actividade mineira claramente e em grande parte, não foram utilizados para a comunidade local.

O Canadá

O Canadá provou que existe uma forte evidência de que a actividade mineira pode promover o bem-estar socioeconómico da comunidade e ser ambientalmente benigna.
A actividade mineira tem sido uma importante actividade económica no Canadá durante os últimos 100 anos, tem contribuído significativamente para o desenvolvimento da economia e elevou os seus padrões de vida. Os lucros gerados por esta actividade
incluem criação de trabalho, de riqueza e de programas sociais. Verifica-se também o desenvolvimento das infra-estruturas e diversificação da actividade económica ao redor da actividade mineira. Mas ao mesmo tempo a actividade mineira continua a ser controversa, porque teve custos ambientais, sociais e financeiros, em particular nas comunidades locais.
A indústria mineira, hoje, tem o potencial de gerar benefícios nas comunidades locais, que no passado foram frequentemente ignoradas.
A existência de diferentes tipos de actividade mineira e de diferentes complexidades das comunidades que com ela coexistem, torna claro que não existe um modelo universal que permita às comunidades aumentarem os benefícios da actividade mineira. Estas dificuldades incluem por exemplo, comunidades que suportam a sua economia exclusivamente na actividade mineira, e as minas temporais (que exercem a sua actividade por curtos períodos de tempo).
Em 1994, o governo, a industria, os trabalhadores, grupos aborígenes e ambientalistas, promoveram “Whitehorse Mining Initiative”, que teve por objectivo, criar orientações à indústria mineira. Estas orientações passavam pela sustentabilidade ambiental, orientação para a comunidade e povos aborígenes, tecnologia e competitividade económica, que originaria objectivos secundários como a criação de emprego e de riqueza. No entanto, foi omisso na declaração, que se deveria fortalecer as actividades economias em redor das minas que é a principal fonte de benefícios económicos e sociais para as comunidades locais e para o país e que influenciam a sustentabilidade económica mineira a longo prazo.
A actividade mineira tem efeitos potenciais nas comunidades locais. Esses efeitos dependem do tamanho da mina, da sua longevidade, se existe numa determinada região um conjunto de minas, o desenvolvimento de outras actividades relacionadas com a actividade mineira, o seu tamanho original e de que forma é desenvolvida a diversificação económica da actividade mineira. O impacto directo é a criação de emprego e riqueza, que subsequentemente estimula outros tipos de actividades económicas (em particular secundárias e terciárias) não necessariamente relacionadas com a actividade mineira.
A medida que outros tipos de actividades económicos se desenvolvem, haverá também o aumento sustentado da oferta de bens públicos e de serviços sociais. Mas por outro lado as comunidades que apenas dependem da laboração de uma mina, quando o minério se esgote correm o risco de se tornar comunidades fantasma
A expansão da actividade mineira para o norte do Canadá, habitada frequentemente por povos aborígenes, apesar de trazer benefícios, traz também desafios. Esta expansão da actividade mineira, traz problemas sociais para os aborígenes. Estes “colonizadores” estão frequentemente associados a padrões de consumo e estilo de vida diferentes, que podem interferir com a vida e tradições da comunidade aborígene. Também podem haver outros efeitos negativos como impactos ambientais na água e no ar e nas suas actividades económicas tradicionais.
Nos anos setenta começou uma serie de iniciativas que tinham por objectivo reconhecer os direitos do povo aborígene, e que teve a sua conclusão em 1999, após aprovação do Parlamento.
Nas últimas décadas, não se tem “construído” comunidades mineiras no Canadá. Os novos projectos consistem em levar por turnos, os mineiros de avião até à exploração e ai alojarem-se em hotéis/contentores, evitando assim os custos de implantação de uma comunidade completa. (fly in, fly out mining). Outra das vantagens reside no facto de uma empresa se puder adequar à procura do minério explorado, simplesmente aumentando o número de alojamentos disponíveis. Evita-se também que desloque trabalhadores e as suas famílias em massa, que provocaria um impacto substancial na comunidade original.
Uma evolução sólida do processo tripartido entre as comunidades, as empresas e o governo foi o instrumento para melhorar os fundamentos para um desenvolvimento sustentado de muitas comunidades mineiras no Canadá. Na mina de Diavik nos territórios do norte, a empresa ofereceu-se para realizar compras substanciais nos negócios locais e eventualmente fazer com que 100% dos seus trabalhadores sejam oriundos da região.
No Canadá, como na maioria dos países mineiros, tem havido forte tendência
para criar regras mais severas para melhor desempenho ambiental, sendo dado ênfase ao encerramento de minas e reabilitação mineira.
A mina de urânio norte de Saskatchewan é o modelo mais sofisticado de relação tripartida em todo o mundo. A evolução foi muito positiva até chegarmos de uma situação de mínimos impactos directos e efeitos externos negativos para uma situação de substanciais impactos directos e efeitos externos positivos. Passou-se de uma mera mina que gerava impostos para o Estado para uma mina que estava virada para a comunidade e para o seu desenvolvimento.
A experiência mineira negativa, cerca de Beaverlodge, gerou uma oposição significativa à mina de Saskatchewan. Um dos impactos que teve foi a de forçar a deslocação de pequenas comunidades tradicionais aborígenes e trouxe consigo problemas sociais enormes.
Em 1978 a Comissão Bayda alterou a forma de olhar para as operações mineiras. As suas recomendações incluíam a alteração das consultas bipartidas para consultas tripartidas, inclusão dos efeitos socioeconómicos e culturais nos processos de decisão e participação do norte de país no retorno dos impostos. Mas ainda mais importante foi o acordo em melhorar os esforços para aumentar os benefícios sociais e económicos, negociações tripartidas cooperativas, aumento do controlo ambiental, de saúde ocupacional e de mecanismos de segurança industrial, consultas a comunidade local e reconhecimento que os gastos sociais seriam dedutíveis nos impostos pagos pelas empresas.
Outra alteração foi a passagem das empresas estatais a privadas. As empresas privadas encetaram dialogo com as comunidades e com vários níveis de governo, onde incrementaram os benefícios para os residentes de Saskatchewan, ao mesmo tempo que impuseram regulação ambiental mais restritas. A integração das comunidades aborígenes na actividade mineira, além de baixar os custos, desenvolveu a economia local.

Roger Moody estima que existam 200 milhões de pessoas que dependem da indústria mineira. Apesar de globalmente a criação de emprego estar a diminuir, a procura de mão-de-obra para a indústria mineira está a aumentar significativamente.
Algumas das contradições da indústria mineira conjugada com os interesses dos países desenvolvidos, como o Canadá, foram já divulgadas em publicações anteriores.
A maioria das empresas mineiras estão a tentar cortar nos custos e despesas de produção, substituindo a mão-de-obra humana por máquinas. Na mina de Saskactchewan-Canadá, a empresa canadiana Cameco introduziu robots para laborar nas maiores reservas de Urânio. No entanto uma tempestade inundou a mina, libertando rádon no interior da mina e os trabalhadores foram enviados para o seu interior, sem usar mascaras de protecção “para salvar a mina e os seus postos de trabalho”. A empresa Cameco afirmou que os podiam trabalhar mais facilmente sem o material de protecção e que a exposição à radiação era bem abaixo dos limites permitidos.
Apesar das limitações existentes o Canadá tem uma política razoável de reabilitação das cerca de 10 mil minas abandonadas. Apesar disso 50% destas minas falharam em proteger as pessoas e o ambiente dos impactos a longo prazo causados pela actividade mineira. Pelo menos em 250 dessas minas são despejados resíduos tóxicos que contaminam os cursos de água e os solos. Concluiu-se também que não existe qualquer ideia da extensão da contaminação em mais de 4.000 das minas abandonadas e também não se sabe que custo é que a reabilitação implica.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Notas sobre a publicação do Banco Mundial "Grandes Minas Y La Comunidade" e "Rocks & Hard Places" de Roger Moody - III

América Latina

As grandes minas na América Latina geraram a entrada de divisas graças à exportação e aumento das receitas fiscais dos Estados. As minas de média escala a nível macroeconómico não tiveram grande impacto.
Um dos problemas que existiu foi a compra de terrenos para implantação das minas, e tive efeitos quer a nível social quer a nível económico. Verificou-se que os preços pagos foram mais elevados que o seu valor antes da existência das minas e as negociações de compra foram difíceis. As maiores queixas tiveram a ver com a falta de consistência de determinação de valores e posteriormente escassearam as fontes de emprego e de receitas para os vendedores dos terrenos.
O que muitas vezes aconteceu foi que os vendedores dos terrenos, geriram mal as receitas das vendas e como os seus terrenos foram ocupados pela exploração, posteriormente perderam as suas fontes de rendimento.
Esta falta de critério e a evolução do mercado, provocaram que na mina de Yanacocha (Peru), os preços pagos foram mais altos depois da evolução da mina. Isto originou um movimento das populações para defender os seus interesses. Embora de evitar, porque pode haver aproveitamento por parte daqueles que não tiveram capacidade de gerir as suas receitas de venda, no fim das negociações foram dadas contrapartidas em equipamentos sociais e de emprego.
Em geral houve benefícios económicos para as populações. Com a evolução dos métodos de mineração, a empregabilidade destas empresas não foi grande, mas não sendo significativa na laboração, foi importante na fase de construção e implementação.
Os efeitos das grandes minas no emprego indirecto foram importantes. O emprego criado por empresas subcontratadas e fornecedoras de bens e serviços, muitas vezes foi maior do que o emprego directo criado pela mina.
O papel dos empreiteiros (outsourcing) é crítico para a dimensão e
sustentabilidade do impacto económico da exploração mineira. Estas empresas aumentaram com o decorrer da exploração mineira e foram a principal fonte de desenvolvimento económico. Houve na maior parte das vezes o cuidado de não permitir a interferência do Estado, pois a sua intervenção não permitiu a criação de bens e serviços prestados por empresas subcontratadas.
Verificou-se que em média os salários do empregados das minas e das empresas subcontratadas em geral superiores que à média do país. Assim os impostos decorrentes desta actividade e a capacidade financeira potenciam o desenvolvimento económico da região onde a mina está implantada.
Em teoria, um dos benefícios que trás a actividade mineira é o desenvolvimento de infra-estruturas rodoviárias, o que muito raramente aconteceu, salvo os casos onde as infra-estruturas nem sequer existiam. Os maiores benéficos nas infra-estruturas foram na requalificação das já existentes, como no caso de estradas, escolas e hospitais.
Outros dos benefícios da actividade mineira vem do retorno para as comunidades dos impostos pagos, quer pela empresa mineira, quer pela comunidade. Particularmente no Peru, existem muitas dúvidas que esse retorno na realidade tenha acontecido.
Os efeitos sociais e culturais normalmente estão conotados negativamente com a actividade mineira. Esses impactos dizem respeito ao aumento da criminalidade e prostituição, conflitos sociais com os indígenas e com as comunidades locais, alteração das hierarquias sociais existentes e inveja entre os que beneficiam da actividade mineira com aqueles que não beneficiam. Os problemas mais evidentes registaram-se na localidade de Cajamarca (perto da mina de Yanacochoa) e na mina de Fachinal. No entanto puderam também ser registados efeitos positivos, em particular nas áreas da saúde, educação e criação de capital social. Na ausência de governos locais fortes, a industria mineira substitui-se muitas vezes nas responsabilidades inerentes a quem governa. Estes efeitos de alavancar as sociedades locais verificaram-se na zona de implementação das grandes minas e de pouca ou nenhuma expressão nas zonas de implementação de minas de média e pequena dimensão.
Algumas das grandes minas promoveram a criação de Fundações, que eram o elo de ligação com as comunidades locais, aplicando programas focalizados no desenvolvimento das comunidades. Um dos problemas registados teve a ver com os benefícios que eram mais focalizados para as comunidades directamente afectados pela mina que originava invejas de outras comunidades, sendo que as Fundações tiveram o papel de estender os benefícios à comunidades que não eram directamente afectadas para a actividade mineira.
Muita da actividade mineira situa-se em zonas de população indígena, mas que está familiarizada com o processo mineiro e por isso não houve grandes conflitos com as comunidades. Mas houve situações em que, por falta de tradição mineira, foi necessário recorrer a mão-de-obra externa à comunidade, o que originou conflitos entre as populações indígenas e imigrantes. No caso da mina de Fachinal a comunidade teve formação, para que os indígenas pudessem ser a mão-de-obra para a actividade da mina.
Umas das perguntas que normalmente se faz, é se os benefícios da actividade mineira são suficientes para suplantar os custos ambientais provocados.
Nenhuma das minas estudadas, revelou substanciais danos ambientais. Todas as minas fizeram esforços significativos para minimizar os danos ambientais e quando ocorreram incidentes menores, responderam prontamente. No entanto muitos grupos, em particular ONG´s ambientais internacionais afirmaram que os danos ambientais foram significativos.
Parece provável que as reclamações feitas foram consequência de uma combinação de diferentes forças. Um dos problemas deveu-se uma comunicação deficiente entre as comunidades e as empresas mineiras, que demonstraram fraca capacidade de relações públicas e não souberam limpar uma imagem histórica de mau comportamento ambiental. Nos primeiros anos de laboração as empresas mineiras não se viraram para as comunidades e não deram informações sobre as suas actividades e de que forma protegiam o ambiente. Outra das razões, deveu-se a interesses políticos locais, que utilizaram os temas ambientais como ferramenta politica, em que utilizaram a desconfiança para obter concessões das empresas em outras matérias, em particular na mina de Inti Raymi e Yanacachoa.
A relação entre as comunidades locais e as empresas mineiras tem três intervenientes: a comunidade local (e regional), o governo central e a empresa mineira. Verificou-se que este diálogo trilateral, que tinha em vista o desenvolvimento local e regional, se fazia entre a empresa mineira e o governo e entre a comunidade e a empresa mineira e por isso havia pouco dialogo entre a comunidade local e o governo central.
O escasso diálogo entre os governos centrais e as comunidades locais, levou com que os benefícios da actividade mineira, nomeadamente impostos, fossem muito pouco direccionados para as comunidades que estavam directamente relacionadas com a actividade mineira. Esta falta de diálogo triangular era uma desvantagem para o desenvolvimento sustentado. As leis mineiras dos três países estudados, têm poucas referências à forma com que os benefícios da actividade mineira devem ser convertidos para a comunidade, o que levou a que as acções das empresas mineiras estejam dependentes da sua boa vontade.
O lado mais forte deste triângulo foi a relação das empresas mineiras com os diferentes grupos da comunidade (autoridade municipais, organizações comunitárias, ONG´s, Igrejas, universidades e proprietários de terrenos). Esta relação fortaleceu ao longo do tempo, e deveu-se ao facto do aumento percepção das responsabilidades das empresas mineiras face à comunidade. No passado a empregabilidade das minas deixava a comunidade local satisfeita, mas o desenvolvimento tecnológico e a consequente diminuição dos postos de trabalho, levou as comunidades locais e exigir outro tipo de compensações.
O desenvolvimento sustentado é ou deveria ser, o objectivo principal da relação entre as comunidades e as empresas mineiras. As comunidades desejam que a actividade mineira lhes traga apoio económico, social e cultural, mas também necessitam satisfazer esses desejos depois do encerramento da mina. Para isso, houve a necessidade desenvolver o capital humano e social, e criação de infra-estruturas, que permitirá que a comunidade se continue a desenvolver após o encerramento da mina.
Apesar das relações intensas entre os governos centrais e as empresas mineiras na implementação e monitorização da mina, na fiscalização, nas questões ambientais e laborarias, o certo é que os governos passaram as suas responsabilidades para as empresas mineiras. O problema é que existe pouca pressão formal tanto do governo como das empresas em proporcionar serviços nas comunidades. Tendo em conta que a posição do Estado na actividade mineira é cada vez menor, a falta de recursos leva com que sejam as empresas mineiras a substituir-se ao Estado.
A melhoria da acção das empresas mineiras tem-se verificado nos últimos anos, mas esta tendência surgiu com a compreensão que a sustentabilidade só se alcança quando os membros das comunidades sintam que são voz activa nas decisões que afectam a sua vida.

Segundo Roger Moody, o Banco Mundial teve a intenção de salvar “Estados falhados”, ofuscados pela corrupção, nepotismo, desemprego, desgoverno e abandono das pequenas explorações. Estes factores resultaram no endividamento e empobrecimento de várias economias. O aumento da competitividade, iria diminuir o tamanho das forças de trabalho e tecnologias mais seguras iriam ser introduzidas pelo sector privado, o que originaria um sistema mais sustentado. Na realidade nenhuma dessas promessas foi conseguida.
No Peru, por exemplo, há poucas evidências que a corrupção tenha diminuído. A empresa norte-americana Newmont pagou subornos para ficar com a concessão da Mina de Yanacocha.
A privatização das empresas do Estado não aumentou os padrões de vida, aumentou o desemprego e não houve retorno para as economias locais.
Apesar das críticas, o Banco Mundial entende que os investimentos em larga escala podem melhorar as performances a nível ambiental e no que se refere aos direitos humanos e para Roger Moody, essa é uma das maiores ilusões.
A Mina de Yanacocha é explorada pela empresa norte-americana Newmont é promovida pela IFC (Internacional Finance Corporation). O Banco Mundial demonstrou falta de capacidade de supervisão, falhou na avaliação das falhas do projecto e desprezou os direitos da propriedade indígena. Mesmos os consultores do Banco Mundial entenderam que o retorno da actividade mineira é deficiente. O IFC não providenciou que a Mina e o Estado estariam livres de risco. O investimento foi basicamente para providenciar “conforto político” para a Newmont e seu parceiro interno, apesar do mesmo estar com algumas dúvidas sobre o reinício da actividade mineira.
Em Junho de 2000, após o maior investimento da IFC, foram derramados 151 quilos de mercúrio. Foram instaurados processos contra a Newmont e foi mesmo multada pelo Estado do Peru. O Banco Mundial entendeu que a companhia falhou em evitar o desastre e que o governo peruano não tinha legislação capaz. Enquanto o IFC continuava a afirmar que Yanacocha promovia o emprego em larga escala, os consultores do Banco Mundial Gary MacMahon e Félix Remy, eram da opinião que os impostos obtidos da actividade mineira, deveriam ir para as áreas regionais e locais, e que era claro que esses impostos não revertiam a favor dessas áreas, que se verificaram elevados níveis de prostituição, abuso de álcool e doenças relacionadas com a actividade mineira.
Em 2006, sem as compensações devidas do desastre de 2000, os camponeses impediram a Newmont de abrir uma nova mina.
No Chile, o presidente Salvador Allende, em 1970 nacionalizou as empresas mineiras e provocou impactos nas empresas norte-americanas implantadas no país. É sabido que as companhias norte-americanas, juntamente com a CIA, ajudaram no golpe de estado que derrubou e assassinou Salvador Allende.
Mas o ditador Augusto Pinhochet não desmembrou a companhia de cobre nacionalizada, tendo em conta que os militares tinham benefícios financeiros da actividade mineira. Cerca de 10% dos lucros da empresa estatal são directamente encaminhados para os militares
A indústria do cobre continua a ser muito importante para a economia do Chile, mantém um fundo de estabilização mineral, com o acordo do Banco Mundial, com a contrapartida em baixar o défice e a divida externa.
É importante entender se a economia chilena, se mantém sólida e impermeável a acção estrangeira e se o sector público vai manter o controlo sobre a actividade mineira. Especialistas afirmam que a economia não deve estar dependente da actividade mineira, mas que esta deve ser um dos pilares do desenvolvimento económico.
O aumento dos preços do cobre no mercado internacional, alavancaram os lucros da actividade mineira, que gerou por parte dos funcionários mineiros a exigência de uma maior participação nos benefícios da empresa pública e por sua vez outros sectores da população reivindicaram que se estendessem à restante sociedade. Questionou-se também o envio de fundo para os militares, quando a sociedade chilena não tinha retorno dos mesmos. Enquanto a economia do Chile estava classificada em 7º lugar pela sua macroeconomia, em questões de educação estava em 76º lugar e nas ciências em 100º lugar. Tecnicamente o Chile deveria ter um potencial elevado quanto Pás expectativas sociais da população.

Notas sobre a publicação do Banco Mundial "Grandes Minas Y La Comunidade" e "Rocks & Hard Places" de Roger Moody - II

Os objectos de estudo da publicação Grandes Minas Y La Comunidad, são dois casos distintos, no que se refere à sua localização e desenvolvimento dos respectivos países.
Não foi importante a descrição de cada um dos casos, mas sim de focalizar a atenção na determinação dos “stakeholders” e de que forma a intervenção mineira os afectou. Optei também para que de alguma forma e se faça a descrição de “stakeholders” comuns a Las Cruces e apenas uma breve referência a outros “stakeholders”.
O livro Grandes Minas Y la Comunidad tem algumas semelhanças com o que poderemos encontrar em Las Cruces, uma vez que Las Cruces é a uma das maiores minas a céu aberto da Europa.
O livro Grandes Minas Y la Comunidad apresenta seis estudos que analisam o impacto da actividade de minas de média e grande dimensão nas comunidades locais. São examinados os efeitos socioeconómicos, culturais e ambientais que as explorações mineiras provocam nas comunidades vizinhas. O principal objectivo do estudo é analisar os custos e benefícios das operações mineiras, e em particular a sustentabilidade dos benefícios recebidos pela comunidade. Identificam-se também as melhores práticas de desenvolvimento mineiro (início, extracção e encerramento).
Com a globalização e queda do bloco comunista, notou-se um aumento do desenvolvimento da actividade mineira das companhias locais e multinacionais nos países em via de desenvolvimento ou com economias em transição. Em muitas destas economias o desenvolvimento é por ventura uma das maiores fontes de riqueza e desenvolvimento.
Simultaneamente, tanto a recente diminuição do papel do Estado na indústria
mineira como uma comunidade internacional mais activa, mudaram as expectativas
responsabilidade das empresas mineiras na protecção ambiente e sua relação com as comunidades locais. É agora geralmente admitido que o sector de mineiro deve centrar-se na resolução de eventuais efeitos negativos sobre os ecossistemas frágeis e comunidades locais. Ainda que as grandes empresas mineiras internacionais sejam melhores cidadãos ambientais que as pequenas empresas nacionais, é altamente publicitado incidentes negativos gerados pela actividade mineiras. Por um lado, grupos ambientais internacionais e locais estão cada vez mais envolvidos em litígios ambientais com empresas mineiras. Por outro, as comunidades locais estão cada vez mais conscientes de que sofrem mais com os impactos negativos da exploração mineira, mas recebem poucos benefícios.
A instalação de uma mina tem consequências económicas a nível nacional e local. Uma grande mina cria emprego directo tanto na fase de construção como operativa, e indirecto através da atracção de serviços que podem ou não estar relacionados com a actividade mineira. Podem originar a criação de riqueza e a entrada no país de divisas estrangeiras, originado benefícios económicos directos, como por exemplo a criação de emprego e benefícios indirectos como por exemplo o aumento dos níveis dos salários, que por sua vez originam receitas e impostos para o Estado.
Não é evidente que as grandes empresas mineiras, decidam localizar em países com baixas preocupações ambientais. Com algumas excepções, as grandes empresas usam as mesmas tecnologias em países em vias de desenvolvimento como em países desenvolvidos, e normalmente os seus padrões ambientais são superiores aos padrões locais. Contudo tem havido incidentes graves que tem sido avidamente capitalizados pelos críticos da actividade mineira.
Não são apenas os impactos económicos um factor de preocupação no estabelecimento de uma nova mina. Os impactos sociais e culturais são particularmente importantes, principalmente no que toca às populações aborígenes. A chegada de trabalhadores de outras regiões do país e mesmo do estrangeiro, pode criar choques culturais intensos e impor uma mudança do estilo de vida das populações aborígenes.
A desigual distribuição dos custos e benefícios, pode também alterar as hierarquias locais e ter sérias implicações culturais. Os benefícios de actividade mineira podem impulsionar a criação de emprego, do comércio e a reactivação cultural das áreas deprimidas. Mas pode ocorrer que as populações indignas encarem a chegada de trabalhadores e das suas famílias, de uma forma que a sua cultura e modo de vida sejam subjugados.
No passado a industria mineira, substituía o Estado em muitas das suas obrigações como por exemplo a criação de infra-estruturas, escolas e sistemas de saúde. Agora estes benefícios centram-se cada vez mais nos funcionários das empresas e menos na comunidade e por isso existe a necessidade cada vez maior do Estado se financiar para fornecerem estes serviços.
Os impactos sobre a saúde das comunidades podem ter efeitos sobre as questões ambientais, sociais e culturais. Por outro lado, os benefícios económicos podem tem impacto nos cuidados de saúde prestados a uma comunidade, por via do aumento dos rendimentos e de impostos.
A maior preocupação em termos de saúde, refere-se à saúde ocupacional e a segurança industrial. As grandes empresas estão conscientes dos problemas destas áreas, mas também se devem preocupar em que circunstancias locais é que se desenvolve a actividade mineira.
Outros dos impactos na saúde são aqueles que se referem às situações ambientais, como por exemplo a contaminação dos solos e das águas, a qualidade do ar, que tanto podem ser originadas da actividade normal da empresa, como após o encerramento das mesmas.
Assim é importante que a laboração da mina seja feita com processos limpos e ecológicos e que exerça a sua acção de substituição do Estado e proporcionar infra-estruturais sanitárias que elevem os patamares dos cuidados de saúde prestados.
É importante que as empresas mineiras tenham uma forma de actuar clara tanto na fase de licenciamento como de laboração. As normas, regulamentos, padrões fiscais e ambientais devem ser claros e específicos. Devem ter uma estreita colaboração com as comunidades locais e envolverem-se com as ONG´s.

Quanto ao Banco Mundial, em 2001, criou a EIR (Extractive Industries Review), para determinar se a industria mineira tinha consequências na diminuição da pobreza mundial. A EIR concluiu que não. Mesmo assim o Banco Mundial rejeitou a maior parte das recomendações. Algumas das recomendações referiam que o Banco deveria apoiar projectos se estes fossem em benefícios da comunidade local. O presidente do Banco Mundial entendeu que as recomendações não eram consistentes com os objectivos do Banco em ajudar a combater a pobreza nos países em vias de desenvolvimento. O Banco Mundial foi acusado de não se conseguir imiscuir dos interesses das grandes empresas mineiras. Os grandes projectos do Banco Mundial foram para projectos de exploração de petróleo para países desenvolvidos.
O Banco Mundial promoveu a privatização da indústria mineira, nos países dela dependentes (principalmente os não desenvolvidos). Juntamente com as maiores companhias mineiras promoveram junto dos países, a forma de comportarem com o sistema privado e reformas para alterar os procedimentos que impediam a privatização de estrangeiros. Alterações que permitiram o desmantelamento de empresas estatais e que deram o controlo da industria mineira a empresas de países desenvolvidos
Roger Moody denuncia no seu livro a promiscuidade das companhias mineiras, com o apoio de governos ditatoriais.
São denunciadas as catástrofes ambientais cometidas, mas afirma que nos últimos tempos a atitude tem mudado, com parcerias com “stakeholders” e incentivando o diálogo com os mais cépticos, mas também que ainda existem graves comportamentos anti-sociais e ambientais.
Ao mesmo tempo que as grandes companhias mineiras tentam dar uma imagem de transparência e melhoria nos processos, enfrentam várias acusações de desrespeito pelas populações, de deficiente protecção ambiental e de não haver retorno dos lucros da exploração para as comunidades onde operam. No entanto, o governo do Canadá está a permitir que as empresas mineiras usem reserva de água potável onde derramam resíduos tóxicos.
Todos os minerais são finitos. A diminuição das reservas cresce a um ritmo acelerado e assim não será possível haver sustentabilidade a longo prazo. O elevado crescimento de economias como a indiana e chinesa, está a provocar uma elevada procura e consequente diminuição dos recursos minerais e apesar dos esforços e reciclar e reutilizar, o mesmo não tem sido suficiente.
Existe algum consenso que alguns minerais pela sua toxicidade não devem ser explorados. Em alguns países desenvolvidos, como por exemplo os Estados Unidos e a União Europeia, a exploração das reservas de amianto foi proibida, mas noutros como o Canadá e a Rússia isso não aconteceu. O mercúrio, que foi banido dos termómetros da União Europeia, é “exportado” pela mesma União Europeia, sob a forma de componentes eléctricos e electrónicos para os países africanos.
Escolher o melhor método de exploração requer que se distinga entre tecnologias limpas e “sujas”. As minas subterrâneas têm maior empregabilidade, mas acarretam maiores riscos de acidentes de trabalho e de doenças relacionadas com a actividade mineira. Por outro lado as minas a céu aberto ocupam grandes áreas de solo fértil.
Para Roger Moody é importante ter uma visão humanista, que avalie os depósitos antes da exploração. Tem que se perceber se os efeitos socioeconómicos são compensados pela rentabilidade gerada e se existe a possibilidade de se explorar minério compatível noutras localizações.
Os territórios aborígenes contem uma grande parte das grandes reservas minerais. Na “Declaration on the rights of Indigeneos People”, entre outras coisas, entende-se que os estados devem consultar e cooperar com as populações indígenas sobre a abertura de uma exploração mineira. Países como o Canadá e a Rússia votaram contra esta declaração e outros países com forte dependência mineira abstiveram-se.
Grande parte dos funcionários que trabalham nas minas, não são funcionários das multinacionais. Normalmente trabalham através de empresas subcontratadas e por sua conta. No entanto estes são acusados de envenenarem os rios como cianeto (no caso das exploração do ouro) e de se envenenarem a eles próprios. Apesar de estarem a tentar ganhar a vida, são prejudicados pela sua singularidade e por não terem a capacidade de se organizarem para reivindicarem os seus direitos. Trabalham em péssimas condições e estão a ajudar a redução dos custos das empresas mineiras.
A conclusão que Roger Moody tira é que as decisões de que o quê, quando, onde, como e quem deve exercer a actividade mineira não deve ser a industria mineira. Deve-se lutar contra a privatização dos rios, lagos e oceanos a favor a industria mineira e que as reservas minerais são património da humanidade.

Notas sobre a publicação do Banco Mundial "Grandes Minas Y La Comunidade" e "Rocks & Hard Places" de Roger Moody - I

Nota introdutória:

Na tentativa de identificar os “stakeholders” da indústria mineira, parece-me um exercício interessante fazer uma ligeira abordagem sobre estas duas publicações que pela sua visão, nos darão uma ideia do comportamento e como deve operar a indústria mineira.
Assim, elegi os livros Rocks & Hard Places de Roger Moody e a publicação do Banco Mundial Grandes Minas y la Comunidad.
Roger Moody é o editor do Website Mines and Communities (MAC) (http://www.minesandcommunities.org/). É também investigador e activista que tem trabalhado com organizações comunitárias, em particular na América do Sul, Ásia-Pacifico e em África. O site MAC, expõe os impactos sociais, económicos e ambientais da actividade mineira e em particular o modo como afecta as populações indígenas e as comunidades que pela actividade mineira são influenciados. O site foi criado em 2001 por organizações e indivíduos de sete diferentes países que se reuniram em Londres para exigir maior responsabilidade e transparência por parte da indústria mineira. As reivindicações do MAC estão descritas na Declaração de Londres de 2001, revista posteriormente em 2008
Pelas minhas publicações anteriores, somos levados a pensar que Roger Moody e o Banco Mundial se encontram em lados opostos.
O meu entendimento que estes dois documentos não são os dois lados da mesma moeda, mas sim o complemento sobre o entendimento da actividade mineira. Assim, vão ser feitas algumas referências a ambas as publicações.
Importa referir que os resultados, interpretações e conclusões são feitas por economistas, sociólogos e antropólogos que não estão ligados directamente ao Banco Mundial e por isso não expressam a opinião do Banco Mundial.